O espaço entre o discurso e a prática na educação atual

Há uma distância que, muitas vezes, passa despercebida no cotidiano educacional. Ela não está nas paredes das escolas, nos quadros ou nas carteiras. É uma distância mais sutil, quase invisível, mas profundamente presente. É o espaço entre o que se diz e o que se faz. Essa lacuna, descrita por Paulo Freire quando nos alerta sobre a necessidade de aproximar a fala da prática, permanece desafiadora, sobretudo em um mundo cada vez mais digital e acelerado.

Vivemos tempos em que o discurso sobre educação é vasto e prolífico. Fala-se muito sobre cidadania, ética, sustentabilidade, inclusão e tecnologia. São temas nobres, com potencial transformador. As palavras fluem nas salas de aula, nos congressos, nos discursos oficiais. No entanto, é na concretização dessas ideias que o desafio se revela.

A era digital intensificou essa questão. Se antes o discurso era limitado ao que o professor dizia ou aos livros que os alunos liam, agora, há uma enxurrada de informações ao alcance de um toque na tela. A tecnologia democratizou o acesso ao conhecimento, mas também trouxe um dilema: com tanto a ser dito e visto, o que, de fato, é praticado? O que se transforma em ação?

A prática educativa, nesse cenário, precisa mais do que nunca estar em sintonia com o discurso. Não basta falar sobre o uso consciente da tecnologia se as escolas ainda são ambientes que reprimem a criatividade digital dos alunos. Não basta pregar a importância da cidadania sem que os próprios espaços educacionais reflitam esse valor nas interações cotidianas, nas decisões e nas atitudes.

A educação sempre foi, em sua essência, um campo de possibilidades. Porém, essas possibilidades só se realizam quando o discurso que construímos em torno delas ganha forma no mundo real. A fala sobre sustentabilidade, por exemplo, só será significativa se as escolas estiverem ativamente engajadas em práticas sustentáveis. A discussão sobre ética e respeito à diversidade só fará sentido se for vivida em cada interação entre alunos e professores, na valorização das diferenças e no combate a preconceitos.

Na era digital, a velocidade com que a informação circula muitas vezes torna a prática uma questão secundária. Vemos, lemos, discutimos, mas muitas vezes não agimos. Essa desconexão entre discurso e prática pode gerar um sentimento de frustração, principalmente entre os jovens, que têm em suas mãos as ferramentas para mudar o mundo, mas nem sempre encontram nos ambientes educacionais a coerência necessária para transformar essa vontade em ação.

O desafio que se apresenta, portanto, é criar uma educação que viva o que prega. Uma educação em que a fala se materialize no dia a dia das escolas, onde as palavras sejam apenas o início de um processo transformador, e não seu fim. É preciso que a escola, como instituição, seja um exemplo de prática coerente com seu discurso. Se ensinamos sobre a importância da solidariedade, que essa solidariedade seja vivida nas relações entre todos os membros da comunidade escolar. Se falamos sobre inovação tecnológica, que a tecnologia seja uma aliada no processo de aprendizagem, e não apenas uma ferramenta ocasional.

No fundo, a essência da educação não está apenas no que se ensina, mas em como esse ensino se transforma em vivência. Paulo Freire nos lembra que o discurso vazio, sem prática, é estéril. O mundo digital oferece um vasto campo de possibilidades para aproximar o que se diz e o que se faz. Cabe à educação, agora, descobrir como utilizar essas ferramentas para garantir que a distância entre a fala e a ação não se alargue, mas se encurte a cada dia.

O futuro da educação depende disso. De um esforço constante e consciente para alinhar o discurso e a prática, para que, num dado momento, a educação seja mais do que palavras, mas uma vivência plena do que ela realmente prega.