O samba é prece. E nasceu no terreiro.

O Brasil adora fingir que não sabe de onde veio. Rejeita a raiz, esconde a origem, embranquece a cultura até parecer palatável à sua hipocrisia social. É por isso que ainda hoje há quem diga com orgulho: “não gosto de macumba” — mas se emociona ao som do samba, sem perceber (ou sem querer perceber) que uma coisa está profundamente ligada à outra.

O samba nasceu nos terreiros. Nasceu da dor, da fé e da resistência. Foi no chão batido do candomblé, entre atabaques e corpos em transe, que o ritmo ganhou forma. O samba é filho direto da espiritualidade africana, da força dos orixás, da cultura negra perseguida e marginalizada. E negar isso é negar a história.

Não há como separar o samba de sua alma religiosa e ancestral. Cada batida é um chamado. Cada canto é uma prece. Cada roda é um ritual de memória coletiva. Celebrar o samba e desprezar os terreiros é como aplaudir a árvore e cuspir na raiz.

O Brasil precisa parar de aplaudir a cultura negra com uma mão e apedrejá-la com a outra. O racismo religioso ainda vive camuflado no cotidiano — nas piadas, no nojo forjado, no desprezo travestido de moralidade cristã.

O samba é um ato de fé. E todo ato de fé merece respeito. Mesmo quando incomoda quem ainda não aprendeu a enxergar além do próprio preconceito.